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Ação Católica Brasileira e Ação Integralista Brasileira

O seguinte texto foi retirado da tese Por uma Ação Católica: hiperedição dos rascunhos de cartas de Eulálio Motta, no Caderno Farmácia São José. Para compreender bem do que se trata a Ação Católica Brasileira e qual sua relação com o movimento político de Ação Integralista Brasileira, comumente conhecido como Integralismo, é necessário apresentar os dois movimentos e contextualizar historicamente. A Igreja Católica, após a Proclamação da República, perdeu grande parte de sua influência no Estado, como afirma Magalhães (2005), “A proclamação da República em 1889, de inspiração positivista e maçônica, fez extinguir o padroado (Magalhães, 2005, p. 2)”. O padroado se refere a uma troca de benefícios, uma concordata, entre o Estado e a Igreja, em que a Santa Sé conferia aos monarcas o direito de administrar e controlar assuntos eclesiásticos, como nomeação de clérigos e gerir os bens da Igreja, ao passo que o Estado apoiaria a expansão da fé e das missões religiosas. Pontua-se que o Estado também concedia dízimos arrecadados da Coroa para a sustentação da Igreja, constituindo uma espécia de ‘apadrinhamento’.

Após a Proclamação da República e do Decreto de 1890, que dizia que “[…] nenhum culto ou igreja gozará de subvenção oficial, nem terá relações de dependência ou aliança com o governo da União ou dos Estados”, o regime de concordata que era vigente chega ao fim, e, com isso, houve a separação do Estado e da Igreja, que, consequentemente, perdeu influência política e econômica devido à autonomia da Igreja laicidade estatal. O Estado, se tornando laico, promoveu uma maior diversidade religiosa, fazendo com que a Igreja Católica perdesse seu protagonismo absoluto no cenário religioso nacional, deixando a Igreja em desvantagem, e, a partir de então, passou a se esforçar para melhorar sua imagem e recuperar fiéis que se espalharam e se dividiram em outras religiões, como o protestantismo, por exemplo. É importante considerar que a separação da Igreja e do Estado, principalmente a laicidade estatal, não foi bem aceita pelo Vaticano, que considerou tal movimentação como heresia da modernidade.

A partir do fim do padroado, a Igreja Católica passou a responder apenas ao Vaticano e a Santa Sé, dependendo financeiramente e, principalmente, se orientando ideologicamente por Roma, que, no período, se voltava contra o socialismo e comunismo. Durante esse período, Magalhães (2005) afirma que “[…] o Brasil passava a receber um contingente considerável de congregações religiosas femininas e masculinas européias, encorajados pela Santa Sé (Magalhães, 2005, p. 2), que significa a entrada de missionários europeus no Brasil, com intuito de aumentar o domínio e popularidade católica entre o povo brasileiro, inclusive nos interiores e nos sertões.

Ao pensar em Roma na primeira metade do século XX, pensa-se no período político conturbado que ocorreu após a primeira guerra mundial, o Fascismo. O movimento liderado por Benito Mussolini foi fundado em 1919, mas seu período oficial contempla de 1920 a 1943, sendo que a morte de Mussolini ocorreu em 1945. O Fascismo Italiano tinha como objetivo criar um Estado forte, centralizado e autoritário, e tinha como ideais o nacionalismo extremado – nação acima do indivíduo; o estado totalitário; o culto à personalidade do líder (Mussolini); anticomunismo e antiliberalismo; corporativismo econômico; militarismo e expansão territorial; repressão política e censura; racismo (por aliança ao Nazismo, no princípio, o Fascismo não tinha base racista).

Apesar de alguns princípios básicos aproximarem o Fascismo do Nazismo, como o modelo ditatorial e Estado totalitário, nacionalismo extremo, culto ao líder, anticomunismo e antiliberalismo, militarismo e uso de propaganda para controle social, o Nazismo se difere um pouco, pois sua formação teve base racista e antissemita como ponto primordial; a ideologia principal do Nazismo era com foco na raça e purificação étnica; enquanto o Fascismo tinha foco em unificar nação e Estado, só adotou leis raciais em 1938 após aliança com o Nazismo; e, principalmente, para o interesse deste trabalho, a religião Fascista mantinha base na Igreja Católica, enquanto o Nazismo apresentava uma tendência de culto ao Füher. É importante compreender o modelo ideológico/político de partes da Europa neste período, principalmente italiano, pois ele se relaciona diretamente com os missionários católicos advindos de Roma e demais localidades europeias (inclusive Alemanha) para o Brasil, com intuito de resgatar fiéis e marcar o território religioso de forma mais efetiva, servindo a agenda católica do Vaticano (que também estava desenvolvendo uma Ação Católica Italiana, e esta serviu de base para a criação da Ação Católica Brasileira, com forte atuação por parte de Alceu Amoroso Lima).

O presbiterianismo chegou à Bahia em 1971 e Jatobá (2011) afirma que a tradição oral na cidade de Campo Formoso aponta para uma reação nada amistosa da Igreja Católica (que era associada ao Partido Integralista) perante o crescimento protestante na região, contudo, não impediu que a Igreja Presbiteriana de Campo Formoso tomasse proporções tão grandes a ponto de se tornar a sede do presbítero Bahia-Sergipe, tendo, como reverendos duas figuras importantes: Reverendo Basílio Catalá Castro e Reverendo Eudaldo Lima.

Quando o Estado Novo, que compreende os anos 1937 a 1945, foi instaurado, o Partido Integralista Brasileiro era ilegal, juntamente com todos ou outros partidos políticos, devido decreto do regente Getúlio Vargas. Pontua-se que a correspondência editada nesta hiperedição entre Eulálio Motta e Eudaldo Lima ocorreu entre 22/08/1941 e –/03/1942, período este em que o integralismo ainda se encontrava ilegal. Compreendendo o zeitgeist (se refere ao conjunto de ideias, crenças, valores e tendências culturais que definem uma época específica) do final da década de 1930 e da primeira metade da década de 1940, acredita-se que Eulálio Motta não mencionava o integralismo nas crônicas de sua Ação Católica, cujo os rascunhos se encontram no caderno Farmácia São José – que seriam publicadas – por receio de ser incriminado ou perseguido. Contudo, a própria escrita e publicação dessas crônicas já cumpria a agenda integralista, uma vez que a Igreja Católica e o Integralismo serviam ao mesmo interesse. Assim, quanto mais fiéis Motta conseguisse para a Igreja Católica (ou conseguisse manter no catolicismo), mais potenciais apoiadores do Integralismo ele angariaria.

REFERÊNCIAS

CALIL, Gilberto. Os integralistas frente ao Estado Novo: euforia, decepção e subordinação. Locus: revista de história, Juiz de Fora, v. 30, n.1 p. 65-86, 20, 2010.

Decreto nº. 510 de 22 de junho e nº. 914-A de 23 de outubro de 1890, § 7

FERREIRA, Leandro da Silva. O Sigma e a Cruz: um Estudo Sobre a relação do Integralismo com A Igreja Católica. São Paulo 2021 Trabalho de Conclusão do Curso apresentado ao Instituto Federal de São Paulo, 2021.

JATOBÁ, Tiago F. O vento da mudança sobre o Morro dos Alecrins: reação católica à instalação dos presbiterianos em Campo Formoso – Bahia, primeira metade do século. 2011. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em História) – Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Jacobina, 2011.

LIMA, Eudaldo. Razões de Minha Religião: Por que sou evangélico e não romanista. Casa Publicadora Norte Evangélico Garanhuns, Campo Formoso, Bahia, 1944.

MAGALHÃES, Gilcéia Freitas. Ação Católica, ação política: as influências do grupo católico durante o Estado Novo. UFOP ANPUH – XXIII Simpósio Nacional de História – Londrina, 2005.

MARTINS, Hélio L. A implantação do Estado Novo e a Revolta Integralista. Revista do IGHMB –ANO 72/73–nº 100/101–2013/2014.

SANTIAGO, Stephanne C. Meu caro Eudaldo: edição dos rascunhos de cartas do caderno Farmácia São José, de Eulálio Motta. 2021. Dissertação (Mestrado em Estudos Linguísticos) – Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, 2021.

SANTIAGO, Stephanne C. Por uma Ação Católica: hiperedição dos rascunhos de cartas de Eulálio Motta, no Caderno Farmácia São José. 2025. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) – Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, 2025.